A minha apresentação para a defesa de tese e o link para a tese completa.
apresentação:
(respira fundo)
Olá.
Esta apresentação manifesta-se, tal como a minha
dissertação, num desenlace cronológico, expondo de um modo bastante pragmático
a importância da minha prática artística como processo. Tomando partido deste
desenrolar permanente, apodero-me desta prática para reforçar a minha
individualidade como exercício constante, desvelando caminhos que vão ao
encontro daquilo que é verdadeiramente meu.
Do paradoxo existente entre o Eu como ser único e mutável,
e este mundo que se funde em preconceitos superficiais, surge a inquietude que
questiona as incongruências que restringem a minha individualidade.
Assim, usando o auto-retrato e a auto-representação como
manifestações metafóricas de um processo introspetivo, exponho nesta
dissertação o modo de como este exercício diário e continuo me vai libertando
dessas convenções impostas, desvelando-me sucessivamente, dia após dia, objeto
após objeto.
Para
desvendar caminhos que poderiam elucidar a pertinência e a espontaneidade da minha
prática, foi necessário revisitar o seu começo. Rapidamente verifiquei que não
tenho na memória o seu começo, isso porque não me lembro de não o fazer.
Felizmente para mim, as canetas e as folhas de papel fizeram sempre parte da
família.
Algo que também foi familiar foram as
mudanças.
(sem título, Gif /28 imagens, 2016)
Mudanças de pais mudanças de cidade, mudanças de amigos, mudanças de
família, mudanças de casa.
Sendo filho de emigrantes que foram filhos de
emigrantes, é escusado dizer que as deslocações, fossem elas reais como as que
eram feitas de carro, ou as virtuais como as que eram feitas de olhos fechados,
foram suficientes para diluir qualquer tipo de certeza que eu pudesse ter em
relação ao dia de amanhã.
Esta
atmosfera incerta levou-me a estar atento e a dedicar-me ao Aqui e ao Agora. A
prática artística encarregou-se de reforçar esse exercício, pois é nela que eu
me vou recolhendo e é são os seus resultados que me vão revelando.
Esta é
a primeira memória que se mostra pertinente para contextualizar o modo de como
eu encaro e atuo no mundo em que me encontro.
A
segunda memória é o fato de nunca me terem faltado materiais nem vontade para
progredir com esta ânsia em criar.
Usava tudo o que tinha à mão, desde as canetas
que o meu pai deixava no estirador que eu desmontava e montava repetidamente,
os marcadores fluorescentes que a minha mãe tinha no escritório, os cadernos de
capa preta que ainda hoje me acompanham, o famoso Microsoft paint que cedo
apareceu e nunca se ausentou, as tintas que encontrei no lixo que me mudaram a
vida, a handycam que eu usava para arquivar momentos, esse arquivo que eu reutilizava
para desenhar, a fotografia analógica que me fez estar atento à candura da vida,
até ao indesejado smartphone que se tornou imprescindível.
Todas estas ferramentas, que acabaram por
aparecer casualmente no meu quotidiano, são utilizadas e reutilizadas até ao
extremo, analisando ao máximo as suas potencialidades plásticas, possibilitando-me
novas maneiras de explorar o meu dia-a-dia.
É-me importante frisar que ao aparecerem
inesperadamente, estas ferramentas não vieram com qualquer manual de instruções.
Isso tornou-as ainda mais pertinentes.
Dos erros
surgiu a audácia, da audácia surgiu a velocidade, e esta rapidamente se tornou
na melhor companheira para progredir e abrir novos caminhos. Manifestando-se
dessa maneira, a exploração revelava-se cada vez mais impulsiva, traduzindo a
minha subjetividade de um modo intuitivo e transparente.
Deste
modo, a prática começou a acompanhar e testemunhar as minhas inquietações. Os
seus resultados encaminharam-se para uma espécie de comentário social que se ia
alimentando das desigualdades que eu presenteava no meu dia-a-dia.
Mas rapidamente
caí no erro de dedicar o meu tempo aos clichés presentes nos movimentos de
contra cultura, que na sua essência, acabam eles mesmos por fundar-se em
generalizações presentes nos temas que criticam.
Ao
constatar esta incoerência, surgiu uma época de interrogação que se fez
acompanhar por uma fase mais existencialista. Lembro-me que neste período se
repetia várias vezes na minha cabeça a frase “We can’t grow if we wont
criticize ouserlves” mencionada pelo meu amigo de longa data Jello Biafra.
É
nesta fase que o auto-retrato se manifesta na minha prática artística.
(Don't rest!, Gif /30 imagens, 2014)
É
importante verificar que este respigar de memórias vai desvelando ligações que
sempre existiram, mas por me encontrar tão imerso nesta prática, e por ela se
manifestar desta forma tão impulsiva, se omitiam no meio da sua compulsividade.
Citando Giacometti, “quanto mais próximos estamos de algo, mais o fitamos em
escorço.”
Até à data tinham sido raras as vezes que eu me tinha retratado.
Mas rapidamente estes rostos substituíram todos os outros temas que resultavam
desta manifestação. A quantidade e a urgência, sobrepunham-se às questões que
poderiam eventualmente surgir sobre a pertinência deste exercício. Assim,
durante cerca de um ano e meio, estes rostos multiplicavam-se, mimetizando as
minhas dúvidas.
Foi a partir desta compulsividade que o espaço reclamou
um certo reparo. Previamente a este acontecimento, o espaço era indiferente e
isso devia-se ao fato do mundo exterior ser a matéria da qual eu me inspirava
para esgotar o meu tempo. Desta forma, a prática apoderava-se da
imprevisibilidade do acaso e eu deixava-a progredir com o ritmo dos
acontecimentos. Mas no entanto, a pulsão do meu trabalho deixou de acompanhar a
casualidade desta atmosfera.
Gerou-se
a necessidade de poder circunscrever os seus imprevistos, proporcionando-me um
resguardo que pudesse servir de amparo para as minhas inquietações.
Assim surgiu
a necessidade em obter um atelier.
Os
diários gráficos rapidamente se tornaram no amparo desta carência. Folha após
folha, estes cadernos eram apressadamente preenchidos e a quantidade sincronizava
a inquietação.
(Vários diários gráficos, exposição Vago, Arquivo Distrital de Bragança, 2014)
Depois
de algumas dezenas de diários gráficos vorazmente concluídos, o desejado espaço
finalmente compareceu no momento em que ingressei este Mestrado.
A sala
12.
Deste
espaço, a única característica que se manifesta no meio das suas enumeras
falhas é a de ser perfeito.
Lembro-me precisamente do meu primeiro dia nesta sala.
Elevei rapidamente as paredes do meu cubículo. 7 metros de altura, Três metros
de comprimento e 1 metro e oitenta de largura, chão limpo, paredes pintadas de
branco, uma mesa e uma cadeira. Estava pronto para trabalhar.
Mas ironicamente,
nada surgia. Esta crise manifestou-se pelo vácuo que este espaço branco me proporcionava.
Apesar de assim o ter desejado durante algum tempo, este vazio assustava-me.
No
mundo, tudo se move independentemente do meu Ser. Verificando que mesmo estando desanimado, ou sem ideias, o
movimento constante que forma este cosmos cria possibilidades suficientes para
me manter distraído. No entanto, neste espaço oco, a minha atenção
direcionava-se à única coisa que nele existia, e isso era eu.
Confrontando-me
com esta ressonância, rapidamente constatei que a minha identidade necessitava de
uma certa atenção, e assim, os rostos voltaram a aparecer na minha prática.
Deste
confronto surgiu o primeiro corpo de trabalho que desenvolvi neste mestrado,
intitulado de Sem autorretratos.
(Sem
auto-retratos, 2014. Instalação; Pintura, técnica mista. Cem telas em
madeira com dimensões variadas entre 5x7 a 40x50 cm)
Surgiu
uma urgência em encaminhar a maioria do meu tempo a observar-me detalhadamente
e tentar compreender a incoerência que eu sentia.
Ao
angariar vários materiais abandonados pelos ex-alunos desta sala, decidi
construir um grande número de telas e retratar-me repetida e compulsivamente,
olhando para um espelho de pequenas dimensões.
Impor-me
uma repetição obrigava-me a uma atenção mais minuciosa e detalhado, mas com o
acumular destes objetos, apercebi-me que estes rostos se iam realçando no
espaço como fragmentos de um puzzle que eu não conseguia resolver.
O
descontentamento proporcionado por esta fragmentação que se ia repetindo
infinitamente, levou-me a ceder e a desfazer-me destes retratos que me fitavam.
(Sem auto-retratos, 2014. Instalação; Pintura, técnica mista. Cem telas em madeira com dimensões variadas entre 5x7 a 40x50 cm)
A trincha embebida em diluente
tratava de desfazer a camada de óleo que os formava.
Foi
deste impulso que surgiu um estranho reconhecimento naquelas imagens
desfiguradas, que, ao contrário do rosto fixo que o auto-retrato me entregava, tão
bem testemunhavam o movimento da minha condição.
Ao desapropriar-me
do meu corpo, o gesto encaminhava-se ao “para lá da superfície”, acompanhando a
mutação do meu SER, numa representação fidedigna de algo que é impercetível
pelo olhar.
(Sem auto-retratos, 2014. Instalação; Pintura, técnica mista. Cem telas em madeira com dimensões variadas entre 5x7 a 40x50 cm)
Citando
Agostinho da Silva: “a única revolução definitiva, é a de despojar-se cada um
das propriedades que o limitam e acabarão por o destruir, propriedade de
coisas, propriedades de gente, propriedade de si próprio.”
Ao
constatar que a superfície se impunha como véu sobre a minha identidade, foi
necessário refletir detalhadamente sobre esta.
(Scans, 2015/2016. Objeto constituído por uma impressão sobre papel fine print
190 gr. mate e um espelho parcialmente diluído. 22x30 cm.1/1.)
Surgiu então a ideia de a desconstruir. Ao
contrário da destruição, a desconstrução exige um retroceder. Vão-se
desmontando coisas até chegar à sua essência.
Esta ideia fez-me ponderar a pintura como
recurso para progredir com esta pesquisa. Isto porque a pintura evidência
inevitavelmente a minha subjetividade através da irrepetível singularidade do
meu traço.
Algo que não me interessa obter com a minha
prática. Não quero aperfeiçoar uma técnica, procuro apenas a melhor maneira de
denunciar e acompanhar as minhas preocupações.
Além disso, a pintura requer um certo tempo
para a sua execução, permitindo-lhe adulterar a realidade.
O scanner encaixou-se perfeitamente
na necessidade que eu tinha em testemunhar a ação imediata. Gosto de saber que
as ferramentas que utilizo são acessíveis à maioria da população.
Esta ferramenta tem a capacidade de
dar ênfase ao decorrer progressivo do tempo, possibilitando-me como afirma
Gilles Deleuze, “não de produzir ou inventar formas, mas sim de captar forças.”
(Scans, 2015/2016. Objeto constituído por uma impressão sobre papel fine print 190 gr. mate e um espelho parcialmente diluído. 22x30 cm.1/1.)
Assim, tendo a possibilidade de
arquivar um movimento único, pois estas imagens vão-se formando tal como o
scanner me as devolve, procuro arquivar um gesto que luta para ir além da
superfície, realçando a importância do tempo exercido nesta luta perpétua. Surgiu
assim a série Scans.
Para reforçar a tensão entre estas
duas ideias, decidi criar jogos com espelhos, já que também esta ferramenta
possui um caracter de duplicidade.
(Scans, 2015/2016. Objeto constituído por uma impressão sobre papel fine print 190 gr. mate e um espelho parcialmente diluído. 22x30 cm.1/1.)
O espelho parcialmente diluído que
coloco à frente destas imagens salienta uma tensão entre a fixidez, visível na
imagem, e do movimento constante presente na parte refletora do espelho.
Revelou-se ao longo deste trabalho, que
a minha pesquisa poderia progredir de um modo pertinente se eu conseguisse
trabalhar na charneira destes dois conceitos.
Surgindo
assim a necessidade de reflectir sobre a dualidade do verbo reflectir, a
fotografia transcreveu-se para o meu trabalho.
(Reflexos, 2015. 2 conjuntos de Fotografias impressas sobre papel fine
print 190gr. mate e 2 gifs.
Conjunto nº1, série de 10
imagens, 14x21 cm. 1/1)
Esta tem
a capacidade de decalcar a realidade. Literalmente, ao observar-mos uma
fotografia, somos obrigados, como afirma André Bazin, “a crer na existência do
objeto representado, literalmente re-presentando.”
Sendo
a essência do meu trabalho um questionamento permanente do EU e que resulta na
construção de objetos como metáforas, este primeiro núcleo de fotografias da
série Reflexos, simula a génese dessa mesma essência.
Assim, tomando partido dessa
inevitável objectividade que a fotografia entrega, é-me dado a possibilidade de
afirmar a minha luta. O paradoxo neste primeiro núcleo de imagens, salienta-se
no momento em que eu simulo a minha instrospeção, mesmo sabendo que esta ação é
apenas uma simulação.
Uso assim o pragmatismo da
transparência presente na fotografia para criar questionamento no que esta
espelha.
(Reflexos, 2015. 2 conjuntos de Fotografias impressas sobre papel fine
print 190gr. mate e 2 gifs.
Conjunto nº2, série de 10 imagens 59,4x84,1 cm. 1/1)
Conjunto nº2, série de 10 imagens 59,4x84,1 cm. 1/1)
Mais uma vez, a execução do novo
trabalho é inspirada no precedente.
Neste segundo núcleo de fotografias,
procurei um espelho que como é suposto me devolva a realidade. A realidade que
procuro não é tangível pois esta não habita o mundo precetível.
Tal como um espelho irregular que não possui
capacidades de devolver os raios de luz que nele incidem, também a minha
identidade não se encontra correspondente à sua superfície.
Procuro
assim em superfícies irregulares, reflexos que se afastam da precisão do mundo
tangível. Reflexo após reflexo, a dualidade deste verbo ganha o seu devido
valor.
O
absurdo acentua-se, e assim, a imagem que se apresenta distorcida torna-se mais
coerente com o meu Ser, e em
oposição, aquela que é habitual torna-se cada vez mais difícil de tolerar.
Os
reflexos vão salientando a relevância do mundo que me cerca. É
escusado argumentar que a identidade não se forma sem influências.
(Reflexos, 2015. 2 conjuntos de Fotografias impressas e dois gifs
Conjunto nº3, série de 2 gifs (Gif nº1), 35x60 cm (LCD)
Como explica José Luis Brea: “não
existe território autobiográfico além do meio coletivo, da comunidade. A
completa plenitude da vida de alguém é concebida com o efeito cruzado criado
com o outro.”
O mundo que me rodeia funda-se
em incertezas omitidas por pressupostos - incutindo que a fixidez e o visível
são a verdade - criando um poder de resguardo do qual o ser humano se acostumou
e afirmou. AFINAL DE CONTAS, O QUE ERA DE NÓS SEM O NOSSO LOOK!
Apoderando-me desta
incoerência, desenvolvi o ultimo núcleo de fotografias desta série. Criando
instabilidade na segurança que a imagem fixa traz, uso o GIF como médio que enfatiza
a sucessão de imagens.
Este LOOP, materializa a
renúncia em concordar que o meu corpo é o arquétipo da minha identidade.
Se esta sequência de
imagens volta à sua forma original, todavia, a nossa forma de apreender o mundo,
altera-se. A experiência contemplativa forma novos símbolos, proporcionados
pela experiência sensitiva que é constantemente renovada e contaminada pelo cosmos
que nos rodeia.
Apropriando-me dos
meus impulsos, utilizo a construção de série como um modo de explorar
conceitos, usando a minha intuição para desvendar caminhos, afirmando que é no
meio do processo que esses se vão revelando.
Este processo trava-se em sua
maioria dentro do ateliê, pois é nele que me procuro e é nele que me vou
tateando. É esta a realidade que eu anseio e só este espaço me a possibilita.
No entanto, esta prática foi acumulando um
grande numero de objectos e com o desenrolar do tempo, percebi que a minha
pesquisa se tinha tornado num ciclo fechado.
Foi desta apreensão que surgiu a
necessidade em inverter este movimento.
(Panorâmicas, 2016. Instalação; Fotografia impressa sobre papel fine
print. 190gr, 40x180- 60x260 cm.
Conjunto de 4 imagens)
Afirmo,
que quero conhecer-me a mim mesmo e exponho-o, partindo do princípio que o meu
reflexo é um reflexo daquilo que me rodeia e me excede.
Foi neste momento que apareceu uma
ferramenta que se tornou pertinente pela já revelada flexibilidade democrática
que procuro nos utensílios que utilizo. Mas o aspeto fundamental é o facto desta
me caber no bolso. Assim, o smartphone acompanha-me para todo o lado, o que me
possibilita ser imediato com o momento e os meus impulsos.
Comecei então a usar a camara deste
dispositivo e a explorar as suas potencialidades, até chegar ao modo panorama.
Este sistema possibilita-me criar uma composição de várias imagens que se vão
acumulando ao longo de um só tempo de exposição.
Mas ao contrário das imagens da
série scans que emergem de um fundo negro, o modo panorama permite-me captar o
espaço que me circunda. Assim, acompanhando a ânsia de capturas esta batalha, surgiu
este corpo de trabalho intitulado de Panorâmicas.
Mas foi ao imprimi-las que verifiquei as
potencialidades da tira que estas formavam.
(Panorâmicas, 2016. Instalação; Fotografia impressa sobre papel fine
print. 190gr, 40x180- 60x260 cm.
Conjunto de 4 imagens. Objeto final, (Panorâmica nº3) 100x50x50 cm)
Num gesto que desafia a introspeção
- numa atitude centrífuga - as imagens resultantes deste trabalho revelam-se
para fora. É infinitamente indefinido que eu me apresento, como “subject-in-process”, num espaço e num
tempo real, habitado por mim e por quem me fita em simultâneo.
Assim, esta ação, bem como a minha
identidade, deslinda-se com o movimento que o outro cria em meu redor.
Estas analogias são um aspeto
fundamental na minha prática. Elas criam pontes que facultam um certo raciocínio,
elucidando uma certa lógica.
O que se salienta pertinente nesta
linguagem é a espontaneidade com que este discurso se apodera do meu quotidiano
e dos meus trabalhos. Alimentando-se da minha inquietação, deixando que esta me
surpreenda e me revele.
Ao ser obrigado a afastar-me do
atelier por um certo período de tempo, senti que o peso derivado de não ter possibilidade
de desenvolver esta espontaneidade me levava a ser excessivamente crítico com
os trabalhos anteriormente realizados.
Acompanhando esta atmosfera
opressiva, reapareceu sistematicamente no meu dia-a-dia um tragicómico
acontecimento que ocorreu há cerca de dois anos.
(Sem titulo, desenho sobre papelde 80gm x 30, (imagem nº1 e nº19), 2015
Este episódio desenrolou-se no meio
de um canil. Ao tentar passar com um dos cães pelas várias alas até chegar ao
espaço exterior para passeá-lo, este cão é atacado por outro cão. No meio da
adrenalina, decidi meter-me no meio dos dois cães para separar a luta, acabando
por ser mordido pelo cão que estava a ser atacado e que eu estava a tentar
defender.
Inevitavelmente, esta situação irrisória
acabou por surgir espontaneamente na minha prática. Começou a aparecer em
alguma pinturas, mas, ao repetir-se, constatei que elas nada me revelavam, e
isso devia-se ao fato da imagem ser pre-construída antes mesmo de ser
realizada.
Para reduzir esse atrito, voltei a
desenhar.
Os desenhos
que começaram por ser realizados em folhas de pequeno formato, rapidamente
ganharam novas dimensões, desviando-se das folhas que eu estendia para habitarem
nas paredes do atelier. Surgiam assim os primeiros episódios da série DOGS,
DOGS EVERYWHERE.
(Dogs, dogs everywhere!, 2016. Instalação efémera, acrílico sobre parede 170x190 cm)
Dois
aspectos sublinharam ser essenciais neste corpo de trabalho: o primeiro foi a
velocidade da concretização destes desenhos que anulou qualquer hesitação,
dissipando a atuação do meu ego. O segundo foi o fato de não recorrer a um
autorretrato fotográfico nestes desenhos, permitindo desvendar-me de um modo
mais honesto e desprendido, possibilitando-me, usando as potencialidades da
máscara, omitir-me e ironizar a situação.
Estas lutas
existenciais vão-se desenrolando nas paredes do meu atelier. Com a mesma
velocidade em que são concretizados, também são apagados. O contra-senso
existente nesta fuga - paralelamente ao existente no uso da máscara – da enfase
ao absurdo como um dos tópicos fulcrais nestes episódios, criando um fluxo
constante entre a omissão e a revelação que se vão alimentando uma à outra.
O meu
trabalho está em perpétuo desenvolvimento, testemunhando uma tensão visível na
necessidade em repetir, em apagar e recomeçar, apropriando-me da sua
efemeridade para me aproximar à metamorfose da minha identidade. Não se trata
de procurar uma imagem perfeita, mas de partilhar algo de uma certa maneira.
A fotografia de suposta baixa
qualidade que resulta destes trabalhos efémeros, serve de sátira a essa fixidez
indesejável neste processo explorativo.
Sublinhou-se
com o deslindar da minha prática, uma necessidade em ponderar as variações
presentes na satisfação e insatisfação que eu obtinha como trabalho.
Devido à minha dificuldade em esclarecer as
minhas preocupações, este sentimento evidenciou-se no começo da escrita desta
dissertação.
Mas no
entanto, com a consciência proporcionada pela distância temporal, a incerteza e
o absurdo começaram a ser apreendidos de bom grado.
Este “estar em aberto”
possibilita-me uma certa liberdade que tenho vindo a maturar na minha prática.
O fato de
não utilizar: uma linguagem única, os mesmos recursos, as mesmas técnicas, as
mesmas referências, nem os mesmos argumentos, possibilita-me uma autonomia na
minha linguagem autoral.
(Desenhos de corredor, 2016.Instlação; Desenhos sobre papel (técnicas e dimensões
diversas).
Cada sequência de imagens é composta por um número variável de desenhos.)
Cada sequência de imagens é composta por um número variável de desenhos.)
Este último
corpo de trabalho, intitulado de Desenhos de Corredor, vai-se desdobrando em
vários episódios, utilizando vários conceitos, como: o frame by frame, o congelamento
de uma ação, e o uso de vários símbolos genéricos, como ideia de diálogo,
frisando a legibilidade explícita e despretensiosa que manifesto na minha
prática.
A objetividade, a transparência e a
clareza que procuro no meu trabalho, esta que se encaminha na urgência em
democratizar um diálogo, vai de encontro à incerteza visível na complexidade
dos temas que abordo.
(Desenhos de corredor, 2016.Instlação; Desenhos sobre papel (técnicas e dimensões diversas).
Cada sequência de imagens é composta por um número variável de desenhos.)
Cada sequência de imagens é composta por um número variável de desenhos.)
A volatilidade destes é abstrata o suficiente para não
proporcionar qualquer tipo de concordância, independentemente do pragmatismo
com que estes são apresentados. A dualidade acentua a tensão existente nesta
luta sem fim. Como afirma Albert Camus “já não se trata de explicar e resolver,
mas de experimentar e descrever.”
Apropriando-me do ridículo, visível
nestes episódios tragicómicos, exponho a realidade das minhas lutas com leveza.
Isso porque o humor é a única maneira genuína que conheço para manifestar
assuntos que me são íntimos.
Manifestando-se sucessivamente, a
minha identidade exige uma constante observação. Todo o corpo de trabalho até
aqui realizado é uma afirmação desta introspeção como Ser consciente da sua volatilidade, manifestando-se no meio das
incongruências do mundo padronizado que o rodeia.
Este documento realçou a sua
importância como intervalo numa prática que não teve começo e que parece nunca
mais ter fim. Dando-me assim a possibilidade de me afastar para ver esta
exploração como um todo, apercebi-me das potencialidades que um alter-ego
poderia trazer para a minha prática.
(Luck/lock, 00:00:30, 2016)
Surgiu então um colectivo de pseudónimos e heterónimos, sendo
o João gastão um deles, continuando a trabalhar por séries e com um variado
número de médios, onde algumas personagens vão manifestando a sua própria
linguagem e as próprias inquietações.
Exponho a prática artística como
processo, permitindo-me exteriorizar inquietações e manifestar esta luta perpétua, realçando a importância
deste como exercicio, tirando partido da experimentação para me desvelar pouco
a pouco, num questionamento permanente que se opõe à inércia do Ser e que se tornou essencial para
enfrentar os meus dias.
Obrigado.
https://vimeo.com/7152969 :)
ResponderEliminarlol, wtf?
Eliminar:)
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